Secretaria da Segurança Pública da gestão Alckmin diz que não é sua função procurar as famílias das vítimas
REYNALDO TUROLLO JR.
ROGÉRIO PAGNAN
DE SÃO PAULO
O SVO (Serviço de Verificação de Óbitos), ligado à USP, divulgou ontem que fará mudanças nos procedimentos para evitar enterros de “indigentes com RG”, pessoas mandadas para valas públicas sem que suas famílias sejam avisadas da morte.
A decisão foi anunciada três dias após a Folha revelar uma investigação da Promotoria sobre 3.000 corpos enterrados sem que agentes tentassem localizar os parentes.
A mudança nos procedimentos, porém, acabou delegando atribuições à polícia e gerou uma crise com a cúpula da Segurança do governo Geraldo Alckmin (PSDB), que resiste em atendê-las.
O SVO divulgou que, agora, antes de sepultar os corpos não reclamados em 72 horas, como prevê uma regra estadual de 1993, passará a enviar os nomes dos mortos à Polícia Civil de São Paulo.
Em geral, essas são pessoas que passaram mal e morreram desacompanhadas, na rua ou em hospitais.
O SVO diz que é a Delegacia de Investigação sobre Pessoas Desaparecidas que tem “a prerrogativa de esclarecer esses casos”. Para o órgão, sua função é fazer autópsia e declarar óbito, e não há equipe para procurar as famílias.
Em resposta, a Secretaria da Segurança informou que não vai procurar parentes de mortos por causas naturais, pois à polícia só cabe lidar com vítimas de violência.
De acordo com o secretário Fernando Grella, o SVO faz parte do Serviço Funerário, da prefeitura. “O aviso deve ser feito pelo próprio SVO ou pelo Serviço Funerário”, disse a pasta, em nota.
Segundo a secretaria, o que a polícia fará, ao receber um nome do SVO, é consultar no banco de dados se a pessoa consta como desaparecida.
Anteontem, o governo Alckmin já havia transferido à direção da USP a responsabilidade por adotar medidas que pusessem fim ao problema dos enterros dos chamados “indigentes com RG”.
A USP, disse o governo, “é totalmente autônoma” para definir seus procedimentos.
Ontem, a universidade devolveu a responsabilidade pelo caso ao governo, por meio da Segurança Pública. Esta, além de resistir às atribuições, também responsabilizou o Serviço Funerário, comandado pela gestão Haddad (PT).
Lucia Salles, do Serviço Funerário, disse que o secretário de Segurança “está mal informado”, pois, segundo a lei estadual 5.452/86, “o SVO é uma obrigação do Estado”.
“A Secretaria de Segurança nem cruza dados de desaparecidos com os de falecidos”, afirmou Lucia.
Segundo o procurador-geral de Justiça de São Paulo, Márcio Elias Rosa, o Ministério Público criou um grupo de estudos para propor alterações na lei, de forma que polícia e/ou hospitais sejam obrigados a procurar as famílias para avisá-las dos casos.
“Você não poder sepultar, fazer o luto, é uma forma de eternizar a dor. Isso é terrível”, disse Rosa.
Folha de S. Paulo