Projeto Ski na Rua no câmpus da USP dá apoio a jovens carentes

Atleta olímpico e treinador de modalidades praticadas na neve, Leandro Ribela dribla a falta de condições climáticas para os treinos no Brasil com o rollerski – equipamento adaptado que permite ‘esquiar no asfalto’.

Assim, durante muitos anos, boa parte de sua preparação para as competições de esqui cross country ocorreu em plena São Paulo, no câmpus da USP do Butantã. “O rollerski foi criado para possibilitar o treino em países que não têm neve e acabou virando uma modalidade, com campeonatos e até Copa do Mundo”, conta ele.

Em 2012, além da falta de neve, ele resolveu driblar muito mais com essa prática esportiva. Em parceria com o colega e também atleta Alexandre Oliveira, criou o projeto social Sky na Rua, com o objetivo de promover a inclusão social de crianças e jovens de baixa renda.

“A gente sempre via meninos da comunidade São Remo, vizinha ao câmpus, usando a cidade universitária, no fim de semana, para trabalhar, vendendo água ou cuidando de carros. Era uma realidade que incomodava. Achávamos que poderiam aproveitar aquele espaço de forma melhor e resolvemos fazer algo para oferecer mais perspectivas”, lembra ele.

Quase quatro anos depois, o projeto atende a 78 jovens de 8 a 21 anos da comunidade São Remo em três encontros semanais, que abrangem orientação e treinos de rollerski, iniciação ao atletismo, oferecimento de alimentação, aulas de idiomas e outras atividades lúdicas e cognitivas direcionadas também ao desenvolvimento de noções de cidadania e espírito olímpico. Para participar, os jovens precisam apenas frequentar a escola e ter dedicação aos treinos.

ONG – A ação teve início modesto, com quatro garotos, mas acabou sendo impactante. “Em pouco tempo, a gente observou uma transformação importante na vida deles, principalmente em relação à autoestima”, relata Ribela. Em 2013, já eram 15 jovens e o grupo foi crescendo. Há cerca de quatro meses, as meninas também começaram a se interessar, a partir da capacitação de uma treinadora, pois a princípio a atividade era restrita apenas aos meninos. Hoje já são 12 meninas no projeto.

“No ano passado, conseguimos transformar o Ski na Rua numa ONG, para ter uma estrutura melhor”, informa Leandro, que coordena a entidade. Segundo ele, todo o trabalho com os jovens é desenvolvido por voluntários e custeado por colaboradores, mais de 35, principalmente por meio de parcerias.

Entre os parceiros estão a empresa alemã SRB Ski Roller, fabricante de equipamentos de rollerski, a Faculdade de Educação Física da USP e a Confederação Brasileira de Desportos de Neve (CBDN). A empresa alemã faz a doação de cerca de 30 equipamentos por ano, enquanto a participação da unidade acadêmica rendeu a formação de treinadores e a realização de estágios no projeto para os alunos.

O trabalho conjunto com a CBDN prevê a colaboração da entidade no financiamento de viagens a países em que a prática de esqui é tradicional e a seleção e treinamento de jovens interessados em seguir o caminho do esporte. Embora não tenha como foco a formação de atletas competitivos, mas de cidadãos preparados a buscar melhores condições de vida, o surgimento do interesse pelo esporte de alto rendimento acaba sendo uma consequência da iniciativa. “Nesse caso, a gente concilia os dois objetivos”, explica Ribela.

Ídolo – Tendo conquistado sete campeonatos brasileiros de esqui, o título de campeão sul-americano e representado o País nos dois últimos Jogos Olímpicos de Inverno, Ribela é um exemplo para os jovens.

“Ah, o Leandro é tudo de bom, um ídolo, a história dele é uma motivação para gente querer melhorar”, diz Altair Firmino, de 16 anos. Participando do projeto desde 2013, ele é um dos talentos revelados no Ski na Rua.

O amigo Victor Santos, 19 anos, chegou na mesma época e, hoje, ambos são atletas da CBDN, já tendo participado de competições em vários lugares do mundo. A rotina e as perspectivas dos jovens – que usavam antes o câmpus da USP como área de lazer e para trabalhar, fazendo entrega de água – mudaram completamente. “Hoje, esse lugar é a nossa pista”, diz Victor, após participar do treinamento, realizado no local pelo menos três vezes por semana.

Hoje em dia, integra a equipe brasileira de esqui cross country, pela qual se sagrou campeão sul-americano em 2015. Também reúne boas chances de classificação para os Jogos Olímpicos de Inverno de 2018, que serão realizados na Coreia. “É o meu sonho”, ressalta.

Responsabilidade – Altair é outro destaque na modalidade e, em fevereiro deste ano, competiu nos Jogos Olímpicos da Juventude de Inverno, em Lillehammer, na Noruega. Ambos já estiveram em competições e treinos na Suíça, Áustria, Itália, Eslovênia, Chile, Argentina, Noruega, embora antes do projeto nem sonhassem com essa possibilidade.

“Tudo mudou, hoje durmo cedo e tenho mais responsabilidade”, comenta Altair. Victor salienta o grande desafio de frequentar os treinos e se preparar bem. “É bastante legal, mas é importante termos sempre a responsabilidade de representar o Brasil. Isso é algo grande. Temos de chegar e sair bem em todos os lugares,” define com orgulho.

DOE, Executivo I, 23/08/2016, p. IV