Cade volta ao STF para decidir sobre fusões de bancos
Órgão de defesa econômica recorreu ao plenário, depois de ministro votar que caso não era da esfera do Supremo

Há mais de dez anos, Cade e Banco Central disputam quem pode julgar negócios no setor bancário brasileiro

FERNANDO RODRIGUES
RENATA AGOSTINI
DE BRASÍLIA

O Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) recorreu ao plenário do STF (Supremo Tribunal Federal), solicitando que a corte decida quem tem o direito de julgar fusões e aquisições no setor bancário. O órgão insiste em poder dividir as atribuições com o Banco Central.

Esse pode ser o capítulo decisivo na disputa que opõe as duas autarquias há mais de dez anos. Em julho, o ministro Dias Toffoli avaliou que o caso não deveria ser apreciado pelo STF, por não se tratar de matéria constitucional.

O Cade discordou e recorreu da decisão no dia 18 de agosto, apelando ao plenário do STF. Não há prazo para que o ministro apresente o caso ao colegiado.

As duas autarquias divergem na hora de interpretar as leis atuais. O BC entende que tem exclusividade na decisão. O Cade avalia que tem o direito de analisá-las também.

O assunto afeta negócios de bilhões de reais, a exemplo da fusão entre Itaú e Unibanco, que, anunciada em 2008, durante a crise financeira, criou um dos maiores bancos do mundo. Na ocasião, o negócio passou pelo crivo do Cade.

Agentes do mercado entendem que decisões sobre a legalidade de fusões e aquisições devem ficar com o Banco Central, que seria mais sensível ao tema.

Para o Cade, os bancos têm de se submeter às mesmas regras que as demais empresas do país. É o que já acontece com outros setores regulados, como os de energia e de telecomunicações.

A análise compartilhada ocorre na maior parte dos países. Mesmo na Costa Rica e nos Estados Unidos, onde a decisão é tomada pelo banco central, o órgão antitruste pode emitir um parecer.

“Nosso debate está em descompasso com o que acontece no resto do mundo”, diz Jean-Paul Veiga, professor da faculdade de direito da USP.

O procurador-geral do Banco Central, Isaac Sidney Ferreira, discorda: “O Banco Central, na qualidade de regulador, supervisor e autoridade de resolução do sistema financeiro, além de autoridade monetária e cambial, responsável pela manutenção da estabilidade monetária e financeira, dispõe de informações, conhecimentos técnicos e experiência sobre o sistema financeiro que nem o Cade nem nenhuma outra entidade no governo detêm”.

Segundo ele, tal percepção consolidou-se após a crise financeira mundial.

AMBIGUIDADE

A queda de braço começou em 2002, quando o Cade multou o Bradesco por não ter notificado a compra de um banco. O Bradesco questionou na Justiça a decisão e perdeu.

Em 2008, recorreu ao STJ (Superior Tribunal de Justiça), que suspendeu a punição, mas manteve uma ambiguidade sobre o mérito: afinal quem teria o direito de julgar? Para o Cade, houve empate entre os ministros.

O BC discorda.

Segundo o Cade, a situação atual cria insegurança jurídica. Há ainda o temor por parte do órgão de que a regulação seja inteiramente transferida ao BC, o que impediria investigações sobre cartel, por exemplo.

Folha de S. Paulo