Crítica Livro
RODOLFO LUCENATristeza e dor, mais do que medo e assombrações, povoam “A Mulher de Preto”, romance da britânica Susan Hill que deve ganhar mais visibilidade com a estreia do filme homônimo.
Lançado em 1983, trata-se de uma história de fantasmas em que não há figuras cobertas por lençol branco ou que fazem “buuu” ao dobrar a esquina; também não aparecem mortos-vivos horripilantes a decepar cabeças.
Basta a presença de uma jovem enlutada para provocar calafrios numa pequena comunidade rural.
Transformada em vingança, sua amargura não escolhe vítima: qualquer um que a aviste é alvo da maldição.
O leitor, porém, demora a ser apresentado à figura que vestia “uma roupa de um preto intenso, que parecia ter sido claramente desenterrada de algum baú velho”. A mulher “estava sofrendo de uma terrível doença debilitante”; pálida, tinha “a pele fina extremamente esticada nos ossos, de forma que emitia um brilho azul-esbranquiçado”.
Quem a viu foi Arthur Kipps, que relata seu encontro com a Mulher de Preto como forma de exorcizar sofrimentos do passado. E escreve como se fizesse um boletim de ocorrência, em ordem cronológica: não há um crime, um mistério, um momento de terror que precise ser desvendado; ao contrário, a tensão é construída lentamente.
Chega a explodir, mas é só no final que todo o mistério se explica e o leitor descobre a origem do “horror mortal e do terror no espírito” que por décadas acompanham Kipps.
O tom relatorial, que, não raro, anda de mãos dadas com a burocracia, é dado desde a primeira frase.
O racional -encarnado aqui pelo metódico advogado- se contrapõe ao sobrenatural; é como se o ceticismo de um avalizasse a realidade e a concretude do outro.
A isolada mansão é o palco do embate. A determinação de Kipps de saber quem e o que havia visto é solapada pelo pavor, o horror, “o medo do mal”. Descobre que, afinal, fantasmas existem.
Após ter ficado perto da morte, acaba por conhecer a história que aterroriza aquela comunidade.
Quase perde a razão e passa por dias de febre e desvario, mas retorna a sua vidinha cotidiana. Não sem levar consigo o temor de ser uma futura vítima da Mulher de Preto.