Para delegado, trabalho policial não muda, mas comportamento judicial fará traficante arregimentar garotos
AFONSO BENITESO chefe da Polícia Civil paulista, delegado Marcos Carneiro Lima, criticou ontem a súmula do STJ (Superior Tribunal de Justiça) que determina a não internação de adolescente detido por tráfico de drogas que não seja reincidente, não tenha usado violência ou grave ameaça e não tenha descumprido uma medida socioeducativa.
Para ele, a decisão, publicada na quinta-feira, é “estímulo a quem comete crime”. A súmula vai balizar as decisões de juízes da Infância e deve reduzir o número de internados em unidades como a Fundação Casa, em São Paulo, onde 42,7% estão por tráfico de drogas.
Folha – Como a súmula influencia o trabalho da polícia?
Marcos Carneiro Lima – Na esfera policial, continuamos na mesma dinâmica, combatendo o tráfico. Agora, quando chegar à esfera judicial, vai acabar estimulando o traficante a arregimentar mais adolescentes para o crime.
No domingo, o colunista da Folha Ferreira Gullar escreveu artigo ressaltando que a sociedade fica envergonhada de punir. Concordo. Porque tem de haver punição.
O senhor acha que essa súmula é negativa para a polícia?
Sim. Ela é um estímulo para quem comete crime.
Qual é o percentual de jovens em um grupo de traficantes?
Não existe dado preciso sobre isso. Mas, na maioria dos casos, há vários adolescentes para assumir a responsabilidade porque a punição para eles é mais branda.
Assumem crimes que não cometeram, como o de chefiar o bando. Isso acontece principalmente nas biqueiras, onde se vende a droga.
Muda o trabalho da polícia?
Não. Teremos mais trabalho, mas agiremos da mesma forma. Se houver adolescente infrator, vamos levá-lo à Justiça e caberá ao juiz decidir.
O importante é que a polícia não esmoreça. Só pelo fato de levar o menor até a delegacia, chamar os pais e mostrar que ele está envolvido em atividade criminosa, a polícia já cumpre seu papel.
Se depois houver o abrandamento, isso vai fazer com que mais jovens pratiquem crimes. Pode até haver um aumento da criminalidade.
Essa questão não é maior do que a discussão policial?
Exatamente. É preciso discutir a questão social. Quem não tem nenhuma opção acaba indo para a criminalidade, para o tráfico. O Estado precisa dar mais oportunidades.
Fonte: Folha de S.Paulo/Cotidiano