Amamentar filhos de outras pessoas, conhecida como amamentação cruzada, não é recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) nem pelo Ministério da Saúde (MS). “Essa prática errada tem um viés histórico e cultural. Na época da escravidão brasileira existiam as amas de leite que amamentavam muitos bebês.
Hoje, com a evolução da medicina, comprovamos que a amamentação cruzada não é aconselhável. A explicação: mesmo parecendo saudável fisicamente, se a doadora estiver doente, seu leite poderá transmitir doenças infectocontagiosas, principalmente o HIV/Aids”, alerta a professora Walusa Assad Gonçalves Ferri, do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP.
Ela diz que essa situação ocorre, se, durante o pré-natal, a mamãe não fez o exame de sorologia para Aids ou fez no período da janela imunológica (com primeiro resultado falso negativo). Segundo a professora, de acordo com a OMS, de 80% a 90% das mulheres com Aids que amamentarem transmitirão o vírus da Aids.
“Outra situação que pode ocorrer é quando a mulher amamentar o filho de outra pessoa que tenha alergia a leite de vaca, por exemplo. Se a doadora de leite comer derivados lácteos, a criança sofrerá com os sintomas da alergia alimentar”, ilustra a especialista da FMRP.
Banco de leite – A mulher que produz leite materno em excesso deve doá-lo ao Banco de Leite Humano mais próximo de sua residência. Essas unidades recebem o material, que passa por processo de pasteurização e esterilização antes de ser oferecido ao recém-nascido prematuro. “Como o leite é pasteurizado, não é a mesma coisa que a amamentação cruzada”, ressalta a médica.
Ela destaca que, após o parto, toda mulher é capaz de produzir leite materno. No caso de parto normal, o leite está disponível 72 horas após o parto e, quando for cesariana, até cinco dias depois. Ela diz que mulheres com Aids, câncer em tratamento quimioterápico, operada para retirada de mama e outras situações raras são as que realmente precisam oferecer leite artificial a seus bebês.
A professora Walusa ressalta que, quando o bebê nasce, a mulher está cansada, enfrenta a variação hormonal, pode apresentar os seios machucados devido à falta de adaptação à amamentação – nessas condições, ela precisa de apoio do marido, familiares e de profissionais de saúde. “Com essas dificuldades, sem a ajuda adequada, a mamãe pode achar erroneamente que não serve para amamentar seu bebê. Se ela não tiver doenças, poderá amamentar ser for bem orientada”. De acordo com o MS, 90% das mulheres saem da maternidade amamentando, mas depois de três meses essa taxa cai para 38%.
Na opinião da especialista, a amamentação no Brasil ainda é tabu: “A mulher pode mostrar os seios no carnaval, mas usá-los para nutrir um bebê é condenável”. Essa situação, segunda a médica, é inaceitável.
DOE, Executivo I, 26/04/2018, p. II