Mudança em lei em SP pode afetar cadastro de devedores
Pela legislação, consumidor com dívida em atraso tem de assinar carta antes de seu nome entrar em lista de inadimplentes

CLAUDIA ROLLI
DE SÃO PAULO

Representantes do comércio e de empresas que atuam no setor de informações de crédito acreditam que a lei estadual que obriga o envio de carta com aviso de recebimento (AR) para o consumidor com dívida em atraso, antes de incluir seu nome em órgãos de proteção ao crédito, terá forte impacto no mercado de crédito do país.

Serasa Experian, SPC Brasil e Boa Vista SCPC, as três maiores empresas desse setor, dizem que a lei pode ainda inviabilizar os cadastros de inadimplentes e dificultar a concessão do crédito.

A lei estadual (nº 15.659) entrou em vigor em janeiro deste ano, mas em março a Justiça paulista concedeu uma liminar favorecendo entidades do comércio e impedindo a obrigatoriedade.

Em agosto, porém, a liminar foi derrubada e o envio de carta AR se tornou obrigatório em São Paulo desde setembro, quando a decisão foi publicada no “Diário Oficial”.

Antes da lei, as empresas enviavam carta simples e o consumidor tinha prazo de dez dias para pagar a dívida. Caso não se regularizasse, era incluído na lista de inadimplentes –ou “negativado” como se diz no setor.

Com o AR (aviso de recebimento), ele precisa assinar a carta. Se não o fizer, seu nome não pode ser incluído no cadastro. Nesse caso, o credor (banco, varejo) tem de fazer o protesto em cartório, que deverá enviar uma carta ao cliente. Se ele ainda assim não for localizado, o cartório tem de publicar edital para fazer a cobrança.

“Com a carta simples, o custo era de R$ 1,40 para a empresa comunicar o cliente. Agora, com o AR, será de R$ 8,60. O custo da comunicação só vai aumentar e isso será repassado ao consumidor”, diz o economista Marcel Solimeo, da Associação Comercial de São Paulo.

“Como o custo sobe, em vez de mandar mais cartas, o comerciante, que não terá condições de arcar com isso, pode passar a enviar menos cartas e as informações dos inadimplentes ficam imprecisas.”

Lucas Caiche, diretor de produtos da Boa Vista SCPC, diz que a empresa já notou diferença no recebimento de informações dos inadimplentes. “A base de dados já perdeu cerca de 2 milhões de registros de dívidas no Estado de São Paulo, entre os dias 10 e 30 de setembro, quando a lei voltou a vigorar”, diz.

Segundo ele, uma grande rede varejista também já informou que, como o custo de envio de cartas subiu, reduziu o avisos de cobrança enviados. “A cada cem endividados, antes a rede emitia 80 cartas simples. Agora, como o custo subiu passou a emitir 20 cartas ARs para devedores”, explica Caiche.

“Ou seja, muitos maus pagadores podem deixar de entrar nas informações do cadastro”, completa.

A Serasa Experian calcula que somente em setembro, já com a carta AR em vigor, 3,1 milhões de dívidas em atraso em São Paulo deixaram de ser incluídas no cadastro.

“A lei acaba estimulando o credor a ir protestar no cartório, quando a AR não for assinada. Só que o consumidor, mesmo depois que quitar a dívida, terá de ir pessoalmente ao cartório, tirar seu nome do protesto e pagar taxas para isso”, diz Nival Martins, superintendente do SPC Brasil.

Se o valor da dívida protestada for de R$ 1.061,01 a R$ 1.275, pagará taxas de R$ 103,66.

Para a Proteste, “o consumidor não pode ser penalizado com a inclusão em cadastros de inadimplentes sem ter informação da dívida e tem a proteção do Código de Defesa do Consumidor. O Aviso de Recebimento é uma forma de garantir que alguém recebeu e ele foi notificado.”

Folha de S. Paulo